Publico aqui mais uma de várias anotações anti-baconianas que fiz para mim mesmo enquanto refletia sobre o modo como penso as relações entre o saber e o poder para fazer um diagrama delas.
Para Bacon e para toda uma tradição de pensamento sobre a política bastante atual ainda hoje, saber é poder. E isto considerando tanto o exercício do poder de uns sobre outros quanto o exercício de poder sobre as coisas inanimadas, e sobre o mundo natural ao nosso redor como um todo. Essa concepção das relações entre o saber e o poder me parece espantosamente limitada. Digo espantosamente porque me espanta que tanta gente inteligente a acate.
A anotação sobre a ignorância intrínseca do saber que fiz para mim mesmo minutos atrás, enquanto ia formulando meu diagrama, foi a seguinte.
Existem saberes radicalmente diferentes, com implicações diferentes sobre o poder de ação humano (que não se limita estritamente ao exercício de poder de um sobre outro). E certos saberes são paradoxalmente dependentes da ignorância. Existe uma ignorância intrínseca (e inclusive até certo ponto metodológica) no saber científico, e também no saber tecnológico. A ignorância intrínseca do saber na verdade está sempre presente, e se dá em diferentes níveis com diferentes implicações: há uma ignorância que caracteriza o limite e o fundo contra o qual se afigura o conhecimento; uma que é estratégica e circunstancial, visando potencializar o que há de saber; uma que é metodológica (estratégica, mas padronizada, tecnicizada); e uma que é ignorância ignorada, sob capa de ilusão de saber. Em todos esses níveis em que pode estar a ignorância intrínseca do saber, ela pode se apresentar em diferentes graus de consciência para o ignorante.